28.9.08

Quotidianos VII

Um dia já descansado e cheio de sol. Até parece que voltamos a estar em Agosto, tal é o calor que se sente. E ainda bem porque ontem foi um dia cheio de ansiedade. E de preocupação. Não porque tivesse tido que trabalhar todo o dia na empresa - já estou habituado a estas situações que nos alteram os planos previamente concebidos - , mas porque, não recebendo a informação necessitada em tempo real e verificando que o atraso era já claro, me comecei a preocupar. Valeu a tecnologia. E a possibilidade de ficar a saber, a uma distância que os meus passos, mesmo habituados a correr as muitas maratonas da vida, nunca alcançariam, que chegaste bem. E essa foi a minha melhor notícia. 
Agora, só falta esperar por outra notícia que seja, também ela, excelente e confirmadora de tudo aquilo que tu mereces. Acredito que virá em breve.

26.9.08

quotidianos VI

Trabalhar intensa e duramente até às tantas. Ler, reler, compilar, procurar, pesquisar. Ter uma pilha de livros técnicos à minha volta. Estudar. Muito. Paralelamente olhar lá para fora e ver o Sol. Não o conseguir sentir, mas vê-lo. E começar a entristecer. Não porque o sol já se pôs no momento em que escrevo este post, mas porque ele poderá rarear noutros locais. Mas nunca, se eu puder impedir isso! E farei o que estiver ao meu alcance para garantir que o Sol permaneça sempre, com a sua energia, luz e vigor a iluminar determinados locais.
Conversa no msn que me deixou sobejamente feliz. Ter a certeza que o Sol há-de permanecer como astro rei sempre e que as nuvens escuras que, volta e meia, carregam a chuva, o vento e as tempestades, e nos trazem algum temor e desconfiança, partirão, definitivamente lá para bem longe.

21.9.08

Quotidianos V

Philip West
O anzol, 1977

Óleo sobre tela

99,5 x 65 cm

Ex-colecção Cruzeiro Seixas, doação Eng. João Meireles, colecção Fundação Cupertino de Miranda

Mayanna von Ledebur
A preocupação pelo estado de saúde de um amigo. As notícias acerca do seu estado. A leitura ansiosa dos jornais. A busca, com olhar clínico, de ofertas de emprego numa área específica do saber e da acção. A alegria por ir encontrando algumas coisas. Sempre são alternativas, mas o ambiente económico está, infelizmente, muito degradado. Todavia, há-de-se encontrar aquilo que se deseja. O importante é nunca cruzar os braços. É acreditar. E lutar por aquilo em que se acredita. Com veemência. Com fé. Com entusiasmo. Com alegria. Com vontade de vencer.
No fundo, procurando sempre, nos acasos do quotidiano, a Poesia que nos permite olhar o real e sonhar. E acreditar que, pela imaginação, pelo sonho, a Poesia é possível. Visita minunciosa à exposição sobre o Surrealismo, na Fundação Cupertino de Miranda. Redescobrir, nas palavras do comissário da exposição, toda a Poesia que guia a Vida. A provocação. As origens. O pensamento mágico. O acaso. O jogo. O delírio. A arte e a recusa das convenções estéticas vigentes. Aprender com quem sabe e ter gosto nessa aprendizagem. Banho cultural intenso, prolongado, no dia seguinte, por uma visita solitária ao Blindspot, de Mayanna von Ledebur, no Museu da Imagem. Olhar o corpo humano de uma outra forma. Vivenciar o alheamento. A dor. A solidão. Mas também a imaginação  e o campo de possibilidades que o corpo potencia.

17.9.08

Quotidianos IV

O momento doloroso do último adeus. Pensei que viesse a ser muito mais complicado e emotivamente arrasador do que efectivamente foi. Pensei, porque já perdi o meu pai, após um longo e doloroso processo de doença.
Foi um momento doloroso, mas que me ficará gravado na alma e no coração pelo contexto em que teve lugar: numa igreja de traça visigótica, inspirada nos mausoléus bizantinos, acompanhado por um tenor e música sacra. Foi um evento, sem dúvida, singular.
As crises nos mercados accionistas, a falência de bancos e de empresas. As reuniões intermináveis na nossa empresa, em busca de uma fusão com outra, do mesmo ramo, e concorrente, na tentativa de nos salvarmos todos de um destino pouco auspicioso. A agitação, o nervosismo. Os balanços de contas. As auditorias. Os recursos financeiros que, afinal, não correspondem aquilo de que necessitamos com as actuais despesas. É preciso reduzir custos. Ou reclamar, junto da multinacional, mais verbas. Pois sim, claro, reclamemos. Mas que faremos se eles nos questionarem acerca da redução da produtividade? Oh, senhor kapitão, mas acha que eles nos perguntarão isso? É o que eu faria, senhora doutora! Oh, senhor kapitão, então, é melhor não reclamar nada, não acha? Acho que é melhor aumentarmos a produtividade, senhora doutora! E já perdemos 10 minutos nesta conversa que não leva a nada... nem produz riqueza alguma...

11.9.08

Quotidianos III

Viagem. Uma tromba de água terrível, diluviana, apocalíptica. Nunca tinha visto tanta água junta numa auto-estrada. E a visibilidade péssima. E o receio de levar uma pancada no carro. E o maldito do gps que nem se dignou autorizar-me a introduzir as coordenadas da viagem. Livre, dirão alguns. Sim, livre, ao ponto de ter de seguir as indicações dos placards da auto-estrada. E esses placards numa letra tão reduzida e tão pouco visível com a tromba de água diluviana. Olha lá - diz-me o meu companheiro de viagem, tu já vais na auto-estrada para a Corunha! Não era suposto termos virado para Santiago? Pois era, mas eu não percebo esta sinalética! Ah?!?... Tu não percebes a sinalética? Tu???? Tu, que tens carta de condução!... Tu, que estás habituado a trabalhar todos os dias com a semiótica!....  
Afinal, tínhamos virado no sítio certo e depois de uma data de curvas e contracurvas, com visibilidade zero, e uma longa fila de viaturas atrás com os 4 piscas ligados, lá entrámos na cidade do Apóstolo.
Novo suplício para estacionar o carro na garagem do hotel. Nunca percebi porque razão os arquitectos fazem os acessos tão apertados e os lugares tão diminutos. 
- Olha, aqui está escrito "Solo coches pequeños"!
- Claro, é o tamanho do nosso! Mais pequeno é impossível.
- E se disserem alguma coisa?
- Olha, se disserem, disseram. Eu acho que este carro é pequeno! O letreiro não indica a dimensão do carro, pois não?
- .....?!??......
Uma tarde chuvosa, mas muitíssimo agradável. Calcorrear o centro histórico. Sentir a pedra molhada, ouvir as vozes e as línguas diferentes. Absorver o mosaico de culturas e de gentes, uns peregrinos, outros turistas, muitíssimos outros habitantes da cidade. As lojas de recordações. Todas iguais. Todas vendendo os mesmos artefactos aos mesmos preços. Muita gente. Alguns verdadeiramente divertidos, com comentários muito pouco religiosos. 
Mesmo às portas da catedral, a descoberta inesperada de um pequeno objecto capaz de transmitir a quem não pôde vir toda a atmosfera e toda a vivência desta cidade.
A catedral, o Apóstolo, a religiosidade de uns paredes meias com a ânsia fotográfica e turística de outros. Estranho.
O dia seguinte: o trabalho. Proveitoso, intenso. A marcação de nova reunião da multinacional agora para uma outra cidade europeia. O assumir de compromissos. O telemóvel que não pára de tocar. O trabalho e as responsabilidades na nossa filial. 
Regressado a Portugal, a notícia de um amigo que sofrera um ataque cardíaco. Hospital. Urgências. Um familiar consegue aceder aos Cuidados Intensivos e as notícias que traz não são boas. O desfecho deverá ocorrer nas próximas horas.
Estou desfeito. Cansado. Preciso de adormecer.
Adenda: já recebi a informação. Tal como era expectável. Afinal, o tristemente célebre 11 de Setembro abriu mais uma ferida, agora muito mais próxima, e com alguém meu conhecido. 

7.9.08

Quotidianos II

Domingo. Acordar tarde. Um sol quentinho, luminoso, oferecido por quem tem o dom de transformar os meus dias de chuva em dias de luz.
Ouvir e reflectir, na casa que é de todos, que devemos amar os outros como a nós mesmos. Com sinceridade, com entrega, com dedicação. Não ouvi, mas acrescento: com paixão.
Almoçar um excelente bacalhau assado na brasa, num restaurante da cidade de Barcelos. Hummm, d-e-l-i-c-i-o-s-o! Recomendável! Quando vieres por estes lados, tens que o experimentar!
Passeio pelo centro da cidade. Reflexão sobre o modo como o povo entende(u) a justiça feita pelos detentores do poder: foi preciso um galo morto levantar-se e cantar para evitar que um estrangeiro, rapidamente considerado culpado de um delito grave, fosse enforcado. De facto, a lenda do galo de Barcelos dá que pensar. Claro que é uma lenda. Um mito. Uma história. Mas muitíssimo interessante, sob vários aspectos: as relações de poder e de domínio; o olhar dos que são considerados estrangeiros ou não membros da comunidade; a forma como eles são tratados; o papel e o lugar do juiz; os papéis do povo, i. é, dos não detentores do poder, etc, etc.
Leitura. Descanso. Trabalho.

6.9.08

Quotidianos I

Levantar tarde, muito tarde, da caminha. Acordar com o sol, quentinho, a entrar pelo quarto dentro. Ai que bom! Principlamente depois de uma 6ª feira, desgracionada, com o stress do trabalho. E a chuva. E o vento. E o frio que se pôs. E o incomodar de um Amigo.
Hoje, bem disposto, tirar a manhã para o abastecimento semanal da casa. Porque também é preciso adquirir a comidinha. Toda a manhã numa grande superfície. Comprar pão. Comprar bolinhos, para acompanhar o café da manhã. Comprar fruta e legumes, para fazer uma refeição, em casa. Almoçar fora de casa. Parece estranho, mas foi assim. Acordar tarde e tarde regressar implica não cozinhar em casa. Se calhar para o bem de todos. Assim não é necessário que haja fingimentos relativamente à qualidade do cozinheiro. Está-se mais à vontade.
À tarde, visita a um importante espólio de arte rupestre e de arte romana. Gostei. Gostei particularmente da sala consagrada aos templos funerários. Não porque seja algo de mórbido. Mas porque me pus a pensar o que dirão os vindouros, daqui a 2000 anos, acerca de nós e do modo como encaramos a morte. 
Mais à tardinha, consulta ao email. Alegria por duas mensagens recebidas. A de uma rosa, que me encheu de contentamento, e a de um Amigo, que me sossegou. Passeio pelos blogs. Comentários. Leitura de jornais online. Trabalho. Leitura de livros técnicos. Redacção. Reserva de alojamento para Santiago de Compostela. Irritação. A reserva online deixou de funcionar mal os dados foram colocados na página. Temor por algum desvio de informação. Telefonema para o hotel. Reserva via telefone. Mas porque é que eu ainda acredito, piamente, nas vantagens da tecnologia quando tenho que resolver tudo à maneira antiga?
Jantar. Confeccionar o jantar. Comidinha saborosa. Elogio. Acredito que foi sincero.
Recital da Orquestra de Câmara do Minho. Noite agradável e simpática. Alguma nostalgia. Os luagres e as pessoas. Consulta do email. Gargalhadas sonoras com uma mensagem recebida. Registo no blog.

5.9.08

Se fosse vivo Farrokh Bulsara, mais conhecido por Freddie Mercury, faria hoje 62 anos.
Mas apesar de não ser vivo, continuamos a ouvir e a cantar as suas músicas, com entusiasmo e apreço.

1.9.08

Intervalo

Acabaram-se as férias que, este ano, foram geridas em termos maioritariamente pessoais. Longe da confusão dos últimos anos. Longe dos horários impostos por alguém cujo rosto eu não conhecia. Longe das rotinas instaladas e que obrigavam, se se quisesse alimentar o estômago, a ter que acordar a determinda hora e a regressar a uma hora que até poderia não se enquadrar nas horas cristãs, mas que obrigava a estar em condições de poder cambalear, no dia seguinte, até uma certa hora, até junto da sala onde se serviam os pequenos-almoços. Longe dos aglomerados populacionais que, qual horda furibunda, mecanicamente se deslocavam para junto da água e, em momentos temporais cronometricamente definidos, regressavam aos seus locais de pousio habitual. Longe da criançada que, jogando à bola, e berrando a plenos pulmões, obrigavam tudo e todos a participar, mesmo que forçadamente, numa alegria que não era a minha. Longe dos stress inumeráveis pelas longas filas de trânsito para atravessar a ponte. Longe da ansiedade por saber aonde iríamos deixar o carro, e, uma vez estacionado, será que ainda estará intacto quando a ele regressarmos? Longe das pessoas que realmente importavam, porque, sendo Agosto, era imperioso fazer a fotossíntese, e activar uma cortina de invisibilidade, só entrecortada, por momentos de interacção telefónica que, feitas as contas, se mostravam absolutamente contínuos, como se a distância e a ausência fossem tão somente físicas, porque o veio discursivo e emocional, esse, era permanente.
Este ano, tudo mudou.
E agora, que as férias se acabaram, e que o ciclo supostamente se repetiria, decidi que tudo será diferente doravante.
Diferente, desde logo, na forma de olhar o mundo.
Diferente, no modo de encontrar as pessoas que realmente importam e pelas quais vale a pena dizer EU, TU, NÓS.
Diferente na forma de me mostrar e de permitir que os outros, aqueles que realmente importam, me conheçam.
Sei que não é habitual efectuar estes balanços de fim de ciclo no dia 1 de Setembro, mas eu nunca fui igual à massa que me rodeia e na qual eu sou um pontinho minúsculo. Tenho clara consciência que defraudo muitas expectativas. E que surpreendo. Às vezes pela positiva. Outras vezes pela negativa. E que sou provocador. E que me dá gozo provocar. E que muitas vezes perco. E que raras vezes ganho.
(Há uns anos atrás, no milénio passado, quando eu era um miúdo de 20 anos - para quem me conhece e para quem não me conhece, informo que, neste momento, tenho mais uns mesitos face à idade anteriormente referida! - , um dia, percorri, vestido com o traje académico de estudante universitário, uma das ruas de uma certa cidade, e tendo-me cruzado com duas senhoras, de idade já avançada, fui brindado com os seguintes epítetos: "É o diabo! Nossa Senhora, valei-nos!!! É o diabo, é o diabo em pessoa! Virgem Santíssima, é o diaboooo!!!!". Estaquei a caminhada e encarei as senhoras. Obedecendo a técnicas que eu vinha aprendendo no meu curso, sobre como controlar grupos e garantir a liderança, tratei de estabelecer contacto ocular com elas. Ficaram lívidas. Mas já não me brindavam com esses epítetos. Não que eu me importasse, mas, enfim, era preciso um bocadinho de lata a mais... Até que uma, puxa de um terço, e começa a gritar, esganiçada, "Vade Retro, demo!" E a proferir não sei que ladaínha, provavelmente para efectuar algum tipo de exorcismo. Aí, irritei-me e, sorrindo-me, disse-lhes: "Sim, sou o diabo. Em pessoa. E as senhoras foram brindadas com a sua vista." Dei uma gargalhada. "Agora, eu ordeno-vos que me saiam da frente e vão imediatamente ter com um representante da vossa religião e lhe digam que me viram, em pessoa e ao vivo, e que eu vos ordenei que fizessem tal coisa!" Ainda pensei em fazer BUUUU!, mas não foi necessário. As criaturas, olhando-me estarrecidas e ofegantes, afastaram-se às arrecuas, bichanando uma para a outra não sei o quê.)